Portugal vai deportar mais de 4.500 imigrantes ilegais e Ministro dispara: "Esse é só o primeiro grupo"
- Vivo Migrações
- 5 de mai.
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Se não saírem dentro do prazo estipulado, poderão ser detidos e deportados à força

O governo de Portugal notificará cerca de 18 mil imigrantes para que deixem o país, segundo anúncio feito no fim de semana, a apenas duas semanas das eleições gerais antecipadas, marcadas para 18 de maio. A votação vai renovar os assentos no Parlamento e será responsável por definir a nova composição do governo. A medida foi comunicada também na véspera do início oficial da campanha eleitoral.
Nos próximos dias, os primeiros 4.574 imigrantes começarão a receber comunicados da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (Aima), orientando-os a sair voluntariamente de Portugal no prazo de 20 dias. Conforme informou o governo, esses imigrantes se encontram em situação irregular e já tiveram seus pedidos de visto negados. Aqueles que não cumprirem o prazo determinado poderão ser detidos e posteriormente deportados de forma compulsória.
O governo, atualmente liderado pelo Partido Social Democrata (PSD) de centro-direita, perdeu a confiança do Parlamento em março, após vir à tona um escândalo envolvendo uma empresa da família do primeiro-ministro e líder do PSD, Luís Montenegro. O episódio de conflito de interesses ganhou destaque nos primeiros debates entre os candidatos.
Entidades representativas de imigrantes e partidos políticos mais à esquerda acusaram o governo de usar a questão da imigração como distração para desviar o foco da campanha e tentar conter o avanço da extrema direita. Entre os imigrantes em situação irregular, o clima é de incerteza e medo.
Embora o governo português não tenha divulgado a nacionalidade dos notificados, o jornal Valor apurou que há brasileiros entre eles. Em resposta, tanto o consulado quanto a embaixada do Brasil em Portugal afirmaram à imprensa local que irão solicitar explicações formais às autoridades portuguesas. A quantidade de pessoas sujeitas à deportação pode ainda crescer, considerando que mais de 110 mil processos de regularização continuam pendentes de análise.
Durante um comício no fim de semana, Luís Montenegro, que concorre à reeleição como primeiro-ministro, atacou o partido de extrema direita Chega, conhecido por seu discurso anti-imigração, acusando-o de ter uma postura “destrutiva”. Montenegro culpou o antigo governo socialista, do Partido Socialista (PS), por adotar políticas migratórias que, segundo ele, causaram a situação atual. Já Pedro Nuno Santos, atual líder do PS, declarou à emissora RTP que o número de notificações emitidas revela que a proporção de imigrantes ilegais é pequena. “Mas a Aima está cumprindo seu papel”, disse ele.
Por temer represálias, diversos brasileiros falaram ao Valor sob anonimato. Um jovem pernambucano de 23 anos, que trabalha como ajudante em um restaurante sem contrato formal, contou que aguarda há mais de seis meses pela regularização. “Eles só são rápidos para cobrar as taxas”, disse ele, revelando ter pago cerca de 150 euros (aproximadamente R$ 950) para dar entrada no pedido.
Uma carioca de 32 anos, que chegou como turista há três anos e ainda não conseguiu se legalizar, afirmou sentir-se rejeitada. “O governo está dizendo ‘volta para a sua terra’”, desabafou. Ela também relatou um aumento nos episódios de xenofobia nos últimos anos. Dados oficiais confirmam essa percepção: o número de denúncias por xenofobia cresceu 142% recentemente.
Portugal, com uma população de cerca de 10 milhões de habitantes, abriga cerca de 1,6 milhão de imigrantes. Os brasileiros constituem a maior comunidade estrangeira no país, somando mais de 550 mil pessoas. Nos últimos anos, no entanto, houve um crescimento expressivo na chegada de cidadãos de países como Índia, Bangladesh e outras regiões do sudeste asiático.
No bairro da Mouraria, em Lisboa, onde vivem milhares de imigrantes asiáticos, o clima também é de preocupação. Jaskaran, um entregador indiano de 26 anos que chegou há pouco mais de um ano, declarou que teme ser deportado. “Quero ficar aqui, trabalho duro e consigo enviar dinheiro para minha família”, contou ele, que divide um quarto com outros nove imigrantes em situação semelhante.
A Aima foi procurada pelo Valor para comentar a decisão, mas não respondeu até o fechamento da reportagem. O mesmo ocorreu com o governo português, que também não se manifestou.
Sistema sobrecarregado e problemas antigos
Para a maioria dos imigrantes, o processo de regularização em Portugal é complicado, agravado por deficiências no sistema público de atendimento. Com o aumento da imigração nos últimos anos, os sistemas ficaram sobrecarregados, e muitos pedidos de autorização ou renovação de residência — inclusive de estudantes universitários — enfrentam atrasos que podem se estender por meses ou até anos. Essa lentidão deixa os imigrantes em situação vulnerável e sob risco constante de deportação.
O governo português já reconheceu o problema diversas vezes e tentou implementar medidas paliativas, como considerar o simples agendamento da entrevista para o pedido de residência como prova de legalidade, ou prorrogar automaticamente vistos vencidos. No entanto, sem um novo documento oficial, muitos imigrantes não conseguem comprovar sua situação regular, o que dificulta até mesmo viagens para fora do país.
Entre as medidas do governo anterior, liderado pelo socialista António Costa, esteve a criação do chamado "visto CPLP", direcionado a cidadãos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. No entanto, esse documento não era reconhecido em outros países da União Europeia e acabou sendo deixado de lado.
No ano passado, foi criada uma força-tarefa para acelerar a análise dos pedidos de regularização. Um grande centro de atendimento foi instalado em Lisboa, com a contratação de dezenas de novos funcionários. Apesar disso, mesmo os imigrantes que tiveram seus vistos aprovados continuam enfrentando longas esperas para a emissão das autorizações de residência definitivas.
Fonte: Valor - Globo.com
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