Imigrantes terão mais dificuldade para registrar filhos nascidos em Portugal
- Zero Studio
- 6 de nov.
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Caso as mudanças da lei entrem em vigor, somente terão direito a ser registrados como portugueses bebês cujo um dos pais tenha residência legal há pelo menos cinco anos no país.

As mudanças na Lei da Nacionalidade, aprovadas na terça-feira, 28 de outubro, pela Assembleia da República, caso entrem em vigor, devem tornar mais difícil o registro de filhos de imigrantes nascidos em Portugal como cidadãos portugueses. De acordo com as novas regras, apoiadas por todos os partidos de direita, apenas os bebês cujos pais comprovem residência legal em território português há pelo menos cinco anos poderão ser considerados portugueses de nascimento.
Atualmente, a legislação ainda vigente determina que basta um dos pais estar regularizado no país para que o filho nascido em Portugal seja registrado como português. Já quando nenhum dos pais tem documentação legal, o registro do bebê só é permitido se um deles viver em Portugal há pelo menos um ano.
Para o advogado especializado em imigração Magalhães Neto, essas alterações podem levar à criação de “cidadãos de segunda classe”. Segundo ele, ao limitar o acesso à cidadania portuguesa para crianças nascidas em solo nacional, o governo acabará incentivando o preconceito.
“Vejo essa medida como um retrocesso. Não podemos esquecer que Portugal é um país envelhecido e precisa incentivar a natalidade. Por isso, qualquer nascimento em território português deveria ser motivo de comemoração, com o bebê sendo reconhecido como cidadão nacional desde o início”, afirma o jurista.
Magalhães Neto lembra que as novas regras também preveem que a criança nascida em Portugal, cujos pais não consigam registrá-la como portuguesa, poderá solicitar a cidadania ao atingir a maioridade, aos 18 anos. No entanto, mesmo que tenha crescido e estudado no país, o jovem precisará comprovar conhecimento sobre os valores culturais de Portugal.
Outra alternativa será aguardar que um dos pais obtenha a cidadania portuguesa por tempo de residência. Com a mudança na lei, esse período passará de cinco para sete anos para cidadãos dos países da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e de cinco para dez anos para estrangeiros de outras nacionalidades.
Dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) mostram que, em 2024, nasceram 84.642 bebês em Portugal, sendo 33% (27.951) filhos de mães estrangeiras. Comparado a 2015, o número de crianças nascidas de mães portuguesas caiu 20% (de 71.462 para 56.691), enquanto o número de filhos de mães estrangeiras quase dobrou (+99,1%), subindo de 14.038 para 27.971.O INE também revela que bebês de mães brasileiras representam 11% do total de nascidos vivos no país e 35% entre os filhos de mulheres imigrantes.
Avaliação do Presidente
A advogada Izabela Vasconcelos defende que, diante do aumento da presença de imigrantes e da baixa taxa de natalidade, não há justificativa para impedir que crianças nascidas em território português sejam registradas imediatamente como portuguesas.“Essas crianças vão crescer em Portugal, estudar em escolas locais e se integrar plenamente à cultura do país. Não serão estrangeiras sem vínculos com os valores portugueses”, afirma ela, rebatendo o discurso de políticos mais radicais, que alegam que Portugal teria se tornado um destino de ‘turismo da gravidez’ por causa de leis mais flexíveis.
Izabela também lembra que, para que as mudanças entrem em vigor, o texto precisa passar pelo crivo do presidente Marcelo Rebelo de Sousa, que pode enviar o projeto ao Tribunal Constitucional caso tenha dúvidas sobre possíveis inconstitucionalidades. Ela recorda que a primeira versão das mudanças na Lei de Estrangeiros foi vetada pelo presidente após o Tribunal considerar o texto inconstitucional. Assim, o Parlamento precisou aprovar uma nova versão do pacote anti-imigração, que acabou entrando em vigor em 23 de outubro.
O advogado Fábio Pimentel, também especialista em imigração, avalia que a exigência de cinco anos de residência legal para um dos pais, no momento do registro de um bebê como português, mostra a intenção do governo de restringir esse direito aos imigrantes com residência permanente.
“Essa nova regra está alinhada às alterações recentes da Lei de Estrangeiros, que ficou mais rígida. O que de fato cria cidadãos de segunda classe não é a lei em si, mas a demora do Estado em regularizar a situação documental dos estrangeiros que decidem viver em Portugal”, destaca o advogado.
Um retorno a 2006
Segundo Pimentel, as novas exigências significam um retorno ao cenário de 2006, quando o Parlamento português começou a modificar a Lei da Nacionalidade, até chegar ao modelo atualmente em vigor.
Já o CEO da Aliança Global Group, Fábio Knauer, alerta para o risco de o país acabar criando uma geração de filhos de imigrantes em situação irregular. Para ele, endurecer demais as leis migratórias pode ter o efeito contrário ao desejado.
“Diante do quadro econômico e demográfico, Portugal não pode se dar ao luxo de errar. O risco de um colapso futuro é real. Com cerca de 10 milhões de habitantes, sendo 1,5 milhão de imigrantes, o país não pode se comparar aos Estados Unidos, que têm mais de 300 milhões de pessoas e podem impor restrições migratórias com menos impacto”, enfatiza.
Fonte: Portal Público PT



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